domingo, 30 de setembro de 2012

Separa-tismo




Poi Zé. Essa história de separatismo estava meio de lado até o Parti Québécois voltar ao poder, partido este que foi fundado pela fusão dos principais movimentos separatistas québécois em 1968. Agora o assunto voltou à tona e enquanto agrada uns, incomoda vários outros.

Tudo começou no começo, claro! A colonização da América do Norte não hispânica começou aqui em Québec pelos franceses, que foi chamada de Nouvelle France/Nova França. Posteriormente, os ingleses dominaram os franceses depois de anos de guerras.

Para dar o tom de quão sério o assunto já chegou a ser, em 1970, o Front de Libération du Québec/Frente de liberação do Québec sequestrou e matou o ministro provincial Pierre Laporte no evento chamado Crise de outubro, que colocou o exército nas ruas de Montréal.

Fizeram um referendum em 1979 e perderam para os federalistas que tiveram cerca de 59% dos votos. Já em 1995, o segundo referendo foi mais tenso. Dessa vez, os separatistas perderam por apenas 1%.

Reza a lenda que houve um êxodo de empresas de Montréal preocupadas com a possibilidade de separação. Reza outra lenda também que o aeroporto Mirabel, o segundo de Montréal, já tinha terras desapropriadas para ser transformado no grande concentrador do país, mas o governo federal mudou para Toronto, bem como outros investimentos para "cortar as asas" do Québec e deixá-lo mais dependente. Quando digo que reza a lenda é porque eu li ou ouvi, mas não tenho nem certeza, nem a fonte.

A volta do PQ ao poder reacende as discussões e receios associados à essa tensão social histórica. Um simples simbolismo usado por esse partido na cerimônia de tomada de posse, que foi a remoção da bandeira do Canadá da sala do parlamento onde foi realizada já causou muita crítica.

Outra bandeira do PQ (juro que o jogo de palavras foi sem querer) é a defesa da língua francesa, que pretendo detalhar melhor em outra postagem. Eles pretendem reforçar a lei 101 que define que o francês é o idioma oficial que deve ser usado no estado, no ensino, trabalho, comércio, negócios, etc. Isso é mais um motivo de insegurança em um grupo social particular, que são os québécois anglófonos. Digo particular porque são uma minoria em uma província francófona de 8 milhões de habitantes, dentro de um país majoritariamente anglófono de 34 milhões de habitantes somados aos 314 milhões de vizinhos estadunidenses. São a minoria da minoria.

Sim, mas quer dizer que o Québec agora vai virar um país independente? Acho difícil. Na minha humilde opinião, o PQ vai preparar terreno para fazer outro referendo se e quando achar que tem chances. Se isso acontecer, acho difícil mas pode ser que consigam mais de 50%. A maioria já viu o prejuízo econômico que isso causaria e não simpatizam com a ideia. Vale ressaltar que o Québec recebe uma boa grana do governo federal, seu perfil de endividamento é comparável ao de países problemáticos da Europa e teria novas despesas a arcar depois de ter sua autonomia.

Mas se der maioria do "sim" no referendo, o Québec se separa, né? Não é assim tão fácil. Eles iriam negociar junto ao governo federal que obviamente não quer perder a província de maior extensão territorial, um quarto da já reduzida população do país, recursos naturais, uma via de transporte fluvial estratégica e ainda de cara deixar as províncias do Atlântico separadas do resto do país com outro país no meio. Também, 51% não é nada expressivo para uma decisão tão drástica. Para ter representatividade, teria que ser a opinião de uns 75% dos québécois a meu ver.

O que me incomoda não é a separação, mas a perturbação que o PQ vai causar na tentativa disso. Por exemplo, já vejo mais discussões enérgicas entre anglófonos e québécois nos comentários de notícias. Os analistas dizem que provavelmente a Pauline Marois vai fazer uma série de exigências de mais autonomia ao governo federal que, obviamente, vai negar. Essa negação deverá ser usada como combustível para inflamar o sentimento de necessidade de soberania.

No mais, estimam que o seu governo minoritário não dure muito porque os partidos de oposição vão se preparar e quando tiverem alguma boa oportunidade, vão pedir novas eleições e pode ser que o PQ caia novamente.

Mas se mesmo assim tudo acontecer fora do que eu prevejo e o Québec se tornar um país independente, eu tenho uma solução: imigrar para o Canadá!!! Já fizemos isso uma vez e possivelmente poderiamos fazer novamente!

quinta-feira, 6 de setembro de 2012

Eleições, queda, separatismo e atentado


 Fiuuu!!! Deixem-me pegar ar para começar. Mas por onde eu começo sem escrever uma postagem longa como um livro? Bom, lá vai. Era uma vez...

Ontem foram as eleições provinciais do Québec. Elas são convocadas quando o primeiro ministro achar mais conveniente...para ele! Tem um prazo máximo, claro. Ainda não somos cidadãos canadenses e por isso não pudemos votar ainda (2014 vem aí!). Os québécois tinham basicamente três escolhas expressivas:

PLQ (Parti Libéral du Québec). É o partido do Jean Charest, que era o primeiro ministro há 9 anos. Eles estão atolados até os chifres em escândalos de corrupção, defendem os interesses dos grandes grupos econômicos, não se importam em devastar os recursos naturais se isso se traduzir em dólares (vide Plan Nord) e são federalistas (Canadá).

PQ (Parti Québécois). Liderado pela Pauline Marois, prega o nacionalismo (o orgulho da nação québécoise), a defesa do francês (reforçar a lei 101) e o polêmico souverainisme/separatismo.

CAQ (Coalition Avenir Québec). Fundado também pelo seu principal representante, François Legault, fundiu-se com o ADQ (Action Démocratique du Québec) e tem apenas uns 10 meses de vida. Apesar de ter umas propostas interessantes, mas com implementações esquisitas, impraticáveis e sem fundamento, seria ainda assim a minha escolha por não ter nem a corrupção do PLQ, nem o radicalismo e o perigoso separatismo do PQ.

Aqui o voto não é obrigatório, mas mesmo assim, cerca de 75% dos eleitores foram às urnas para decidir o rumo de suas vidas. Encerrada a votação às 20h00, começou imediatamente a apuração que já contava com alguns votos antecipados, já que é possível votar em alguns dias antes. As eleições são indiretas, logo, vemos em tempo real na televisão e no site a quantidade de certos ou prováveis deputados eleitos de cada partido. O partido que tiver mais deputados escolhe o seu primeiro ministro, que já é conhecido antes mesmo da curta campanha eleitoral de um mês.

A previsão era de vitória fácil do PQ, mas a tensa apuração mostrava um empate técnico entre o PLQ e o PQ. Uma hora um estava na frente, outra hora era o outro partido. Eu já estava roendo as unhas dos pés. Lentamente, a tendência se definia e acho que por volta de 22h00 eles anunciaram que não tinha mais como reverter a situação. O PQ de Pauline Marois havia ganho as eleições com um governo minoritário. Isso quer dizer que eles não obtiveram mais da metade da quantidade de deputados, mesmo se contarmos com o quarto partido que o apoia.

O texto ainda não está tão longo, né? Pois continuando...

Um pouco antes de meia-noite, eis que começa a confusão. Dois agentes de segurança pegaram a Pauline pelos braços e a levam apressadamente para fora do palco. A platéia não entendeu nada porque não sabia, mas um homem armado de um rifle e uma pistola fez ao menos dois disparos, matando uma pessoa e ferindo gravemente outra dentro do Métropolis, que era onde a Pauline estava fazendo seu discurso de vitória. Na saída, este usou algum artefato para atear fogo na parte de trás do prédio, sendo preso logo depois pela polícia. Enquanto era levado para dentro do carro, o québécois anglófono disse em francês "Les Anglais se réveillent!/Os ingleses estão se acordando!", "C'est la vengeance!/É a vingança!".

Ainda não se sabe ao certo se esse cara pretendia realmente matar a Pauline ou se tem problemas mentais, dentre outros detalhes. Mas acredita-se que foi um fato isolado que não representa a real situação da população.

Já que o CAQ era novo demais para ganhar, acabei preferindo esse resultado. O corrupto e arrogante Charest saiu do poder de forma vergonhosa. Além de seu partido ficar como segundo, este nem se reelegeu como deputado e resolveu abandonar a carreira política. A minha interpretação do resultado foi que os eleitores estavam entre rejeitar a corrupção ou o separatismo. No final das contas, dando um mandato minoritário ao PQ, ficamos com um bom compromisso entre os dois problemas. Falta agora eu falar do separatismo e da lei 101 em outras postagens.

sábado, 1 de setembro de 2012

Visitando o Brasil-Choque cultural reverso


-O sistema está fora do ar.
-Como assim?
-O sistema não está funcionando!
-Hum... E qual é a previsão de retorno?
-Não temos previsão!
-Por que não? Bom, deixe para lá. Então podemos continuar em qual outro posto do Detran?
-Se você for a outro posto, vai ter que fazer outra vistoria do carro.
-Mas eu já tenho esse documento aqui que atesta que o carro foi vistoriado. Ele está datado, carimbado e assinado, emitido pelo próprio Detran e para o próprio Detran!!! É outro posto mas do mesmo órgão!
-Mas a regra é que a vistoria só vale para os posto onde a ela foi feita.
-Mas...mas....como é que...por que? Eu não acredito! Não faz sentido nenhum! Eu vou passar o dia e a noite só para pegar uma segunda via de um documento de transferência!!! Tabernak!

Esse foi um dos vários absurdos que me surpreenderam durante as duas semanas que passamos de férias em Fortaleza, após dois anos e meio morando aqui no Canadá. Uma parte foi apenas relembrar que essas loucuras existem, mas outras foram novidade mesmo que extrapolaram o meu conhecimento.

Eu não sou de ficar detonando sistematicamente o Brasil, até porque sei que tem gente que se sente ofendido com isso e outros que veem como esnobismo. Mas como uma das finalidades de um blog de imigração é relatar as experiências que passamos, e o retorno ao país de origem é uma delas que é importante de ser descrita, sou obrigado a contar como me senti. Se você não gosta de críticas ao Brasil, recomendo parar por aqui

Começou logo no aeroporto, quando ao invés de recebermos bilhetes de voo em papel mais grosso e de tamanho padronizado como em todo o resto do mundo, recebemos somente uns papeizinhos parecidos com cupons fiscais que se amassam e rasgam muito facilmente. Economia de palito de fósforo considerando-se quanto pagamos pelas passagens.

 Eu sempre pensei que um estrangeiro chegando aqui se esbaldaria por causa da moeda forte, achando tudo muito barato. De fato, tem coisas que custam menos mesmo, principalmente as que dependem de mão de obra. Mas mesmo vindo com a taxa de um dólar para dois reais, achei algumas coisas proibitivamente caras. Com pouco menos de 120$ para dois adultos e duas crianças, nos divertimos muito no parque aquático Village Vacances Valcartier aqui pertinho. Já no Beach Park de Fortaleza, nos custaria a bagatela de 270$, que é mais que o dobro. Vetado instantaneamente!

O trânsito é um capítulo à parte que vou tentar resumir para não ser ainda mais chato. Quando imigramos, já tinha muito congestionamento e a educação dos motoristas era digna de um homem das cavernas. Em apenas dois anos e meio, percebemos nitidamente que a quantidade de carros aumentou expressivamente e não houve quase nenhuma mudança na malha viária, a não ser muitas ruas fechadas por obras. Segundo esse artigo, a frota de Fortaleza duplicou de 2002 a 2012 e só no mês de julho, teve um incremento de 6.554 veículos. Planejamento, zero! Ação, zero! E vem aí a copa do mundo de 2014!!!

Tem partes da cidade onde não existe mais o conceito de horário de pico, porque cedinho da manhã já estão congestionadas e permanecem assim até por volta das 21h00. Quando paramos nos engarrafamentos, passa um enxame de motos por todos os espaços possíveis e impossíveis. Uma rua de duas faixas em Fortaleza tem na verdade, 5 vias. O padrão é calçada, moto, carro, moto, carro, moto, calçada, lembrando que também tem motos que andam sobre a calçada. Eu prestava muita atenção porque não raramente, tem delas que cruza a frente do carro abruptamente para dobrar em uma rua de forma que se não freiarmos, passamos por cima. Vi até um louco que pegou a contra-mão em uma avenida movimentada! Mas como pedestre, estava pensando como aqui onde nunca uma moto passa entre carros e por muito pouco, uma que vinha até rápido por entre os carros parados quase me atropelou. Via batida de carros quase todo dia e perto de voltarmos, bateram no carro do meu pai. Não poderia ser diferente! Não cabe tanto carro! Por causa dos muros, os carros não têm boa visão e avançam um pouco nos cruzamentos, o que me dava muitos sustos. É como os revestimentos fumé mais escuros dos carros: mais segurança contra roubos e menos segurança no trânsito.

Prometo que é o último grunido rabugento que faço sobre o trânsito. Estava em uma avenida cujo trânsito estava alternando entre parado e se arrastando como lesma com câimbra. Em uma rua perpendicular, podiamos ver uma fila longa de carros aguardando a oportunidade rara para conseguir entrar na avenida. Quando o motorista de trás percebeu que eu estava começando a deixar espaço do carro da frente para dar a vez a um dos carros da rua perpendicular, começou a buzinar e piscar os faróis repetida e insistentemente. Câlice!!! Não se pode nem dar a vez a um carro que vem um idiota encher o saco! Em Fortaleza é típico alguém buzinar assim que o sinal fica verde, não deixando tempo nem da luz viajar do semáforo aos nossos olhos. Pior que é só para perturbar mesmo, porque normalmente essas pessoa saem mais lentamente que o carro da frente.

Já que é para detonar mesmo, agora vou comprar inimigos no atacado. A Rede Globo continua sendo a fonte oficial de """""cultura""""" brasileira, fornecendo nas novelas as Carminhas, Ninas, empreguetes, "Oi oi oi...", "Eu quero tchu...", etc. Como o futebol, a novela ainda é uma mania nacional. Vale a pena ler um pouquinho sobre Chomsky para entender o porquê da minha crítica. Ele explica como as massas são manipuladas pela mídia através desse tipo de recurso, dentre outros que vemos serem empregados de forma muito competente no Brasil.

Não estou dizendo que não existe cultura no Brasil. Pelo contrário. Por exemplo, foi bom rever os talentosos os músicos de bar com suas versões violão e voz, ao invés de ouvir o Michel Teló até quando estive na Polônia. Acreditem: um colega polonês cantou a letra toda do "Ai se eu te pego" em português bem explicado! "Ahh! Você é brasileiro? Então deve gostar dessa música...". Não! Eu detesto! Vá conhecer Bossa Nova, MPB, etc.

Bom, chega de estresse! Já passou mesmo! O importante é que é sempre bom rever a família e amigos depois de tanto tempo. Também foi bem forte a validação da nossa decisão de imigrar e que fizemos uma boa escolha. Não tenho nenhuma dúvida e não me arrependo nem um segundo. A Mônica e as crianças também pensam assim e de retorno, nos sentimos muito bem voltando não somente para o nosso lar, como também para a nossa cidade. Sim! Foram só dois anos e meio mas apesar do idioma, nos sentimos a vontade como nosso lar aqui e Fortaleza agora passou a ser uma cidade de turismo.