segunda-feira, 28 de maio de 2012

Manifestação dos estudantes


Tudo começou quando o governo do primeiro ministro do Québec, Jean Charest, anunciou o orçamento da província. Este incluia um aumento de 75% das taxas escolares do ensino pós-secundário, que é o mais barato de todo o Canadá. Os estudantes não gostaram e foram às ruas protestar.

Em geral as manifestações são pacíficas, mas houveram casos de vandalismo e confrontos com a polícia. Pelo simples fato de estarem ocupando as ruas de Montréal, isso já atrapalha o trânsito mas chegaram a bloquear vias de pontes, que causa um congestionamento ainda maior. O caso mais extremo foi quando colocaram bombas de fumaça em algumas estações do metrô que causou sua paralização completa da rede. Os culpados foram identificados, presos e liberados mediante pesadas multas. Aqui em Québec, as manifestações foram muito reduzidas e só o que chegou a aparecer com ais ênfase na imprensa foi quando colocaram algo na água da fonte que fica em frente ao parlamento para deixá-la vermelha.

O governo tentou algumas fórmulas para gerenciar a crise, mas só o que conseguiu foi agravá-la. Começou tentando ignorá-la para ver se passava e percebeu que deveria negociar, mas viamos que a ideia era resolver o problema sem ceder nada. Ofereceram empréstimos, o que não satisfez os estudantes. Depois, pegou a ideia destes de cortar algumas partes do orçamento das universidades que eram vistos por eles como desperdícios e reverter esses recursos em abatimento do aumento. O problema era a forma pela qual isso seria implementado: uma comissão de 19 pessoas, das quais apenas 4 estudantes, analisaria os orçamentos da instituições de ensino pós-secundária para encontrar esses eventuais itens que poderiam ser economizados. O problema é que não existia garantia nenhuma de que isso pudesse acontecer e os estudantes interpretaram isso como uma tentativa do governo de ludibriá-los.

Ainda mais enfurecidos, os estudantes reforçaram as manifestações, o que fez com que a ministra provincial da educação pedisse demissão do cargo e abdicasse da sua função de deputada. Charest, por sua vez, tentou ser ainda mais linha dura tentando resolver o impasse com a criação da polêmica lei 78. Esta determina a suspenção temporária das aulas e impõe uma série de regras e restrições em relação às manifestações. Por ela, uma manifestação com mais de 50 pessoas tem que ter seu trajeto, horário e duração enviados à polícia com antecedência mínima de 8 horas, sujeita a aprovação. Caso fujam desses parâmetros, a manifestação é considerada ilegal, os manifestantes podem ser presos e terão que pagar entre 1.000 e 5.000$, ou mesmo entre 7.000 e 35.000$ caso seja um líder estudantil ou de uma união.

Foi como jogar gasolina para apagar a fogueira. Houveram manifestações bem violentas, comfrontação com a polícia madrugada a dentro e 308 prisões em uma só virada de noite. As redes de televisão estavam cobrindo o evento o tempo todo. O grupo estudantil C.L.A.S.S.E. ousadamente conclamou os estudantes à desobediência civil à lei 78, oferecendo suporte financeiro e político aos que fossem presos por infringi-la. Em pouco tempo, começaram a prender em Montréal, Québec e Sherbrook  pessoas sob essa nova lei mas ainda não se sabe como vai ser a aplicação das penas, visto que são bem pesadas e é muito cedo para que tenham diretrizes de como usá-la. Ouvi no rádio de que poderiam enquadar os presos como simples contravenção ao código de trânsito ao invés desta.

Passados mais de 100 dias de manifestação, agora esta toma novas formas como o mouvement des casseroles/movimento das panelas que causa um barulhão pelas ruas de Montréal, com adesão de crianças, adultos e idosos que nem mesmo são estudantes. Também começaram manifestações de solidariedade em Nova York e Paris. A reivindicação original de cancelamento das altas das taxas escolares deu lugar a uma causa difusa que adiciona, por exemplo, o desejo de um ensino pós-secundário totalmente gratuito como o da Finlandia, o protesto contra a corrupção do governo Charest e os grandes grupos econômicos internacionais sendo beneficiados na exploração de recursos naturais do Plan Nord/Plano Norte, com consideráveis prejuízos ao meio ambiente.

No presente momento, o governo começa a falar em voltar a negociar com os grupos estudantis. A pressão está ficando cada vez mais forte porque o verão está chegando e esse caos em Montréal é extremamente prejudicial à sua imagem internacional, sobretudo do turismo. Imagino o estrago que pode haver se a crise continuar até a data da fórmula 1.

Sem dúvida esse desenrolar de eventos vai ter repercussões sociais e políticas na história do Québec. Nunca houveram manifestações com centenas de milhares de pessoas nas ruas como estão acontecendo e durante um período tão longo. A população está dividida entre a favor e contra, porque ambos os lados têm pontos de vista válidos. Espero as partes começem a entrar em consenso para que uma solução apareça e dê fim aos inconvenientes causados à população.