segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Faça atenção à lingua mãe


O título dessa postagem foi propositadamente escrito assim, de uma forma esquisita, para ilustrar um fenômeno que acontece com quem vive em um ambiente que tem uma língua diferente da materna. A frase original seria "Fais attention à la mother langue". Já forma mais usual no português seria "Tenha cuidado com a língua materna". Mais esquisito ainda é saber que com algum tempo, se não cuidarmos, podemos falar assim sem nem percebermos. Mas para o  brasileiro que vive no Brasil, vai soar esquisito como gringo falando.
Eu já estava querendo escrever sobre esse assunto, mas apareceu uma motivação mais forte. Tudo começou quando encontramos por acaso um brasileiro com a sua filha que também moram aqui. Vou deixar no anonimato porque não sei se ele se incomodaria com a publicação. Ele me parecia meio paranóico com a questão das crianças vivenciarem bem o português. Coisas do tipo só falar português em casa, desenhos animados em português via Internet ao invés dos das tv's daqui. Ele perguntava, por exemplo, se tinhamos amigos brasileiros que tinham crianças para que nossos filhos conversassem em português, e por aí vai.
Determinada hora, não sei como, mas ele contou a estória que explica essa postura. Ele é filho de pais não brasileiros. No começo, falavam o idioma materno em casa mas depois de algum tempo, passaram a conversar somente em português. Ele disse que começou a esquecer o idioma materno e depois, perdeu a capacidade de se comunicar neste.
A parte que me tocou foi dizer que a sua avó gostava muito dele, mas apesar de querer muito, não conseguia conversar com o seu neto pois não falava português. Por isso que ele insistia muito para que a filha não perdesse o português.
Eu sabia que as crianças podiam perder um idioma, mesmo sendo o materno, mas não sabia que era fácil assim. E mesmo os adultos não perdendo a capacidade de se comunicar, existe uma tendência de falar esquisito como extrangeiro. Vejo muitos brasileiros cometendo erros de português influenciados pelo francês sem perceber, como por exemplo: "Eu tenho um acento (sotaque) muito forte em francês"; "Eu adoro patinagem"; "Ele vai ir ao trabalho", "...ai eu acionei a vila (prefeitura, Ville de Québec, Ville de Montréal, etc.)", "Não depasse o colega na fila.", "Fiz por habitude (costume, hábito)", "Essa palavra tem dois sensos (sentidos)" e "Faça atenção! (tenha cuidado)". E existem também as interferências que não são erros de português, mas que denunciam por não serem a forma mais usual como: "Isso é bizarro (e nunca dizer esquisito)", "Não importa qual (qualquer um)" e por aí vai. Se eu começar a escrever assim, por favor me avisem! Eu me policio muito, mas pode acontecer.
Outro caso foi uma família que conheci no parque aqui perto. Os pais e as duas filhas estavam conversando em inglês impecável. Quando foram brincar com a Lara, as duas falavam francês também impecável. Começei a conversar com os pais em inglês porque não sabia se falavam francês. O pai nasceu em Nouveau-Brunswick e tem o inglês como lingua materna, ao contrário da mãe das meninas. Mas os pais dele convencionaram de alternar um dia falando em cada idioma. Como aqui em Québec o francês está muito presente, esse casal resolveu só falar em inglês em casa para tentar equilibrar. "Não queremos que as nossas filhas percam o inglês que já falam".
Moral da estória? É difícil aprender um novo idioma e é um desperdício perdê-lo. E isso acontece! Eu estou extremamente incomodado porque já tentei várias vezes e não consigo mais conversar em espanhol como eu fazia no Brasil, quando tinha que me relacionar à trabalho com argentinos, chilenos, uruguaios, etc. Aqui tem muitos latino-americanos que falam espanhol. Temos que praticar e manter o que já adquirimos com tanto esforço. Até concordo que nos primeiros meses seja importante falar francês ou inglês em casa para ajudar na adaptação, mas depois de alguns meses, quando todos já estiverem com um nível razoável de conversação, também acho igualmente importante manter o português em casa.
Eu, eu penso que sim. Pensais vós como isso? (Essa foi de propósito também!)

3 comentários:

  1. Meu marido estuda a parte de linguagem em crianças e ele sempre fala que a língua materna dos pais deve ser a utilizada com os filhos, pois é a língua da afetividade. As crianças vão aprender o inglês e/ou francês vivendo no Canadá na escola, com os amiguinhos etc.

    A parte mais difícil é a escrita e gramática. Meu próprio marido nasceu na Argentina e foi criado no Brasil e não sabe escrever bem em espanhol - o que não faz a menor diferença na vida dele. Mesmo sendo argentino, na Argentina ele é sempre considerado brasileiro e no Brasil sempre considerado Argentino. Infelizmente há grandes chances de isso acontecer com nossos filhos, pois vão ter sotaque falando português (ou fazer erros como os que você mencionou).

    Acho que não tem muito como escapar não ;-)

    Abs

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  2. Err ...
    Não seria fais attention à la langue maternelle?

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  3. Sao três linguas que sao necessarias manter vivas, Francês, Inglês e Português. Nao é facil nao.

    Rona

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